A CRISE ALEMÃ NÃO TEM FIM


 

Escrever sobre a crise que acomete a seleção alemã é inusitado. Um time sempre marcado pela organização defensiva, pragmatismo e por sempre chegar as finais dos torneios que disputa dificilmente enfrentou crises, principalmente nos métodos utilizados dentro e fora de campo. Por isso é estranho fazer esse texto sobre a crise estrutural da seleção tetracampeã do mundo.

A última crise desse porte enfrentada pela seleção alemã foi em 2004, em razão da eliminação precoce na primeira fase da Eurocopa, disputada em Portugal. A federação nacional fez uma grande reformulação que foi do corpo diretivo até a comissão técnica: o então treinador da equipe, Rudi Voller, vice-campeão mundial em 2002, deu lugar ao ídolo e novato como técnico, Jurgen Klinsmann. Para ter uma ideia, foi a última vez que um treinador da seleção foi demitido do cargo.

Esse “tabu” foi quebrado neste fim de semana. A federação alemã anunciou a demissão de Hansi Flick, ex-treinador do Bayern de Munique que assumiu a seleção em 2021, após a equipe levar um verdadeiro amasso do Japão dentro de casa. Os alemães foram goleados por 4 a 1 por uma seleção de nível inferior, apesar dos japoneses terem vencido a própria Alemanha na primeira fase do último mundial. A forma apática de atuar do time alemão nos últimos anos chegou ao limite para a diretoria da federação. Flick está fora e o novo técnico ainda é incerto.

O problema é que essa crise iniciou após o título mundial conquistado em 2014. É isso mesmo! A má fase alemã começou justamente no momento em que a equipe dava sinais de que seria capaz de iniciar um ciclo de dominação no futebol de seleções, inclusive ameaçando a liderança brasileira no número de taças da copa do mundo. O cenário era promissor: um time jovem, jogando junto desde 2010, com veteranos no auge técnico e um método de trabalho considerado exemplar para o mundo. A isso adicione o surgimento de um estilo de jogo moderno, ofensivo, pautado na movimentação, controle do jogo e agressividade, lindo de ver. Aí veio o pós-copa e o inferno astral começou: queda para a França na semifinal da Euro 2016, saída de veteranos referenciais do time como Schweinsteiger, Lahm e Klose, nova eliminação na Euro 2020, para a Inglaterra (último jogo de Kroos pela seleção). Só que o pior foi duas eliminações seguidas da copa do mundo na primeira fase, algo que não acontecia com a seleção alemã desde o mundial de 1978, na Argentina.

O péssimo momento da equipe ocasionou diversos problemas internos. O então treinador da equipe Joachim Low resolveu afastar alguns atletas experientes da equipe como Muller e Hummels, na tentativa de renovar o ambiente e se livrar de jogadores que considerava acomodados após a queda precoce em 2018. O resultado não foi o esperado, Low se desgastou com as lideranças do time e foi substituído por Flick em 2021. Parece cenário de time brasileiro, mas não é.

O resultado da instabilidade são atuações decepcionantes e derrotas acachapantes para rivais inferiores nos últimos anos. Referencias da equipe como Neuer, Gundogan e o próprio Muller (retornou com Flick) não conseguem render o esperado e jovens como Sané, Musiala e Gnabry parecem sentir o peso de liderar o processo de renovação do time. A solução parece recomeçar do zero, assim como em 2004. O time dá claros sinais de que precisa de renovação, com jogadores famintos por novas conquistas. Nenhuma transição é fácil, contudo, no caso alemão o processo é mais que necessário. Assumiu caráter de urgência.

Em 2004, deu certo. Klinsmann assumiu a equipe, chegou a semifinal do mundial disputado em casa e conseguiu o terceiro lugar. Resolveu sair e o seu assistente, Joachim Low, levou o time a final da Euro 2008, a nova semifinal e terceiro lugar em 2010 e ao sonhado tetracampeonato em 2014, com direito a um 7 a 1 inapelável e humilhante na anfitriã seleção brasileira. Se o processo de reformulação dará certo novamente, só o tempo será capaz de mostrar.

Em tempo: a seleção alemã teve apenas ONZE técnicos em toda a sua história. A nível de comparação, o Brasil teve DEZ técnicos diferentes apenas neste século. Segue a lista de treinadores alemães abaixo:

1. Otto Nerz: 1926 – 1936

2. Sepp Herberger: 1936 – 1964

3. Helmut Schon: 1964 -1978

4. Jupp Derwall: 1978 – 1984

5. Franz Beckenbauer: 1984 – 1990

6. Berti Vogts: 1990 – 1998

7. Erich Ribbeck: 1998 – 2000

8. Rudi Voller: 2000 – 2004

9. Jurgen Klinsmann: 2004 – 2006

10. Joachim Low: 2006 – 2021

11. Hansi Flick: 2021 - 2023

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O VELHO LOBO E O KAISER

VINI JR E O DILEMA SELEÇÃO E CLUBE

MADRID AMASSA UM BARÇA DEPRIMENTE